Um morto que anda por aí: Jorge Amado previu a cena em novela da década de 60

Em “A morte e a Morte de Quincas Berro d’Água”, o protagonista morto perambula pelos bordéis de Salvador; e é o leitor quem morre de rir

O escritor Jorge Amado. Créditos: Divulgação

Por Julinho Bittencourt

Revista Fórum – Ao mesmo tempo em que horrorizou o Brasil e o mundo, o caso da mulher que teria levado o tio já morto para tomar um empréstimo em uma agência bancária do Rio de Janeiro, virou meme instantâneo nas redes.

Outros casos semelhantes foram levantados. Além disso vários internautas se recordaram do filme “Um morto muito louco”, comédia de Ted Kotcheff, sucesso de 1989. Nela, o personagem principal passa o tempo todo morto, mas sendo dado como vivo.

Surpreendentemente, no entanto, ninguém, ao menos até o momento, se recordou da genial novela do brasileiro Jorge Amado, “A Morte e a Morte de Quincas Berro d’Água”. Lançada em 1962, a história virou um belo filme, em 2010, dirigido por Sérgio Machado, com Paulo José; e até mesmo um Caso Especial da TV Globo, em 1978, estrelado por Paulo Gracindo e dirigido por Walter Avancini.

A novela do escritor baiano é hilária desde o seu título, ao explicar o apelido do protagonista, o sisudo e aplicado funcionário público Joaquim Soares da Cunha que, de um dia para outro, abandona tudo e cai na esbórnia, com direito a litros e litros de cachaça. Certo dia, na venda do Lopez, ao perceber que o líquido que bebia não era pinga, ele grita desesperado: “ááááááguuuua!”, para risada geral dos frequentadores.

Pronto, imediatamente virou o Quincas Berro d’Água.

Um dia, Quincas Berro d’Água é encontrado morto, sozinho em seu pequeno quarto, em decorrência dos exageros de sua vida pregressa. Seus amigos de bebedeira vão ao velório e percebem nele um sorriso maroto. Tomado como vivo, tem o seu corpo roubado e é arrastado por eles, mais uma vez, para a pândega em bordéis botecos e toda a sorte de orgias.

Esta é sua primeira morte. A segunda vem quando, com seu corpo nas mãos dos companheiros, é arrastado por uma onda e “morre” novamente. Desta vez, e supostamente, ao se jogar no mar. Um “suicídio” atribuído pelos amigos pelo medo de ser, finalmente, enterrado em um caixão.

Semelhanças

A história de Jorge Amado guarda algumas semelhanças com o caso de Paulo Roberto Braga, de 68 anos, e sua sobrinha Érika de Souza Vieira Nunes, de 43, que o teria arrastado morto para assinar um papagaio no banco. Além dos dois perambularem por aí como vivos, eles também, tanto um quanto o outro, viraram chistes na boca do povo.

No caso de Paulo, não faltaram, entre outras, montagens fotográficas com políticos. No de Quincas Berro d’Água, toda a história por si própria – assim como os memes da outra – é uma das formas mais antigas que temos de lidar com a vida e, portanto, também com a morte: rindo das duas.

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