Bolsonaro está só e isso faz dele mais perigoso

Fernando Brito, editor do TIJOLAÇO

Já tem algum tempo que Bolsonaro manda, mas não governa o país. E como não há vácuo na política, o Centrão assanhou-se para, imediatamente, transformar sua derrota na escolha do novo ministro da Saúde em um vitória em escala maior: tornar-se ele próprio o condutor da questão mais importante do país, hoje.

O discurso de ontem de Arthur Lira, muito menos refinado que seu congênere no Senado, Rodrigo Pacheco, embora adoçado por pedidos de “união nacional” e outras bobagens fáceis e simpáticas do politiquês, disse para os ouvidos presidenciais que, se não partilhar o poder com a Câmara (leia-se, o seu grupo), ficará sem poder algum.

Não é bem assim e é provável que Bolsonaro esteja executando apenas um recuo tático, enquanto inventaria – e tenta recuperar – o seu comando sobre as forças que sempre contou como suas.

A começar pelas Forças Armadas, assustadas pelos reflexos da catástrofe Pazuello sobre sua imagem pública. Não é segredo que os generais da ativa não apenas queriam Eduardo Pazuello fora como também não o querem de volta ao serviço ativo. Causou imenso descontentamento, também, a notícia de que Jair Bolsonaro pretendia subverter a hierarquia militar para dar uma quarta – e irregular – estrela a seu “general sanitário”. Pior ainda a possibilidade de que acabasse ocorrendo, com Pazuello no Ministério ou na caserna, alguma medida judicial indicando sua responsabilização sobre a mortandade em Manaus.

Bolsonaro também percebeu – aliás, porque mais do que evidente – que a base parlamentar majoritária que formou com a aliança com o Centrão estava se desfazendo. A sociedade ilimitada com o”Mito”, com o aumento de sua rejeição, estava se tornando tóxica à grande maioria dos parlamentares fisiológicos – mais do que conservadores. Além do mais, a “pindaíba” das contas públicas, mesmo com todo absurdo das “emendas parlamentares”, não prometia, até aonde a vista alcança, grandes vantagens em obras e convênios eleitorais.

Some a isso, ainda, a linha de confronto que se estabeleceu entre o Planalto e os governadores, com inevitáveis reflexos sobre a fidelidade entre estes e os deputados.

O terceiro fator é a economia, onde não só os indicadores, mas a “Carta dos Economistas” (que mais propriamente poderia ser chamada de “Carta do Mercado”) abre um pesada bateria de artilharia contra a política (??) econômica de Paulo Guedes. O jornalista econômico José Paulo Paulo Kupfer, no UOL, resumiu bem a situação: “ao negar a doença e desprezar a cura, Bolsonaro e seu governo afundaram a economia”.

Por rúltimo, mas não menor, o retorno impactante de Lula ao quadro eleitoral, criando, finalmente, um polo visível – e como! – e popular de oposição.

Tudo isso junto e misturado está fazendo minguar Bolsonaro na opinião pública e o ex-capitão sabe que é preciso conter este processo. É tão nítido que até alguns sonhadores da direita sonham em que o há pouco favorito chegue ao ponto de não ir sequer ao segundo turno, algo que ainda é improbabilíssimo.

O problema de Bolsonaro é que ele não pode parar de servir, mesmo em quantidades mínimas, a ração de ódio e estupidez com que alimenta seus fanáticos, patrimônio original e indispensável de seu negócio político eleitoral.

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