Publicado originalmente no TIJOLAÇO
Por Fernando Brito
A Folha de S. Paulo publica, no seu “tempo real” sobre as eleições, notícia sobre seu penúltimo programa de Fernando Haddad em que denuncia e repudia a campanha de calúnias nas redes sociais e no whatsapp – que chega à baixaria inimaginável de dizer que mandou distribuir mamadeiras com bicos fálicos, como parte de um plano para tornar tarados bebês em aleitamento. O tema central da nota, porém, é a frase em que Haddad pede que “Deus abençoe a todos”, expressão de uso comum em despedidas e que quase equivale a um “se Deus quiser”.
Mas vá lá, ainda que seja um micronésimo de grama antes as toneladas de “Deus acima de Tudo”, aos “Oh, Glória” e aos “sinais,fortes sinais” e quejandos que se despejam no horário eleitoral.
O que é ridículo é que uma informação se segue, absolutamente vinda do nada, para dizer que “Haddad estudou Karl Marx (1818 -1883), filósofo alemão que definia a religião como o ópio do povo“.
Ora, é evidente que Haddad, mestre em Economia e Doutor em Filosofia “estudou”Marx, tanto quanto o estudaram Marina Silva e Álvaro Dias (formados em História) , Paulo Guedes, economista posto ipiranga de Bolsonaro e Ciro Gomes, que escreveu livros de economia política. É evidente que o “estudou Marx” quer dizer mais do que a objetividade.
E aí vem a história de que o “filósofo alemão que definia a religião como o ópio do povo“. Não só ele, muita gente antes se referiu às influências da religião no comportamento social e na razão humana, desde Emanoel Kant até Moses Hess, sionista de esquerda a quem é atribuída a criação da frase. Mas não apenas eles.
Falta,a quem fez a exploração barata o contexto em que foi escrita, há mais de 170 anos, na obra Crítica da Filosofia do Direito de Hegel, não como uma ofensa à religião, mas como um ataque às dores humanas que ela tornaria suportáveis:
” A religião é o suspiro da criatura oprimida, o ânimo de um mundo sem coração e a alma de situações sem alma. A religião é o ópio do povo.”
É evidente, claro, que Marx não era um crente, mas a crítica que faz não é à religião em si, mas a sua influência para que os homens não se libertem de seu sofrimento real.
Depois, a intriga segue: “o ex-prefeito de São Paulo considera-se um pós-marxista, mas nunca falou claramente se é ateu ou não”.
Em 2012, a Folha registrava que Haddad é cristão ortodoxo – o que é comum em descendentes de árabes – mas “que não queria usar isso para sensibilizar o eleitorado”.
Que personagens do padrão Silas Malafaia façam este tipo de coisa, a gente entende, porque o fanatismo religioso é a pele de cordeiro de muitos lobos. Mas a Folha, não, se pretende ter ainda algum tipo de consideração dos leitores com algum critério.
Assista o vídeo do programa de Haddad.