Desastre da Previdência será cobrado mais cedo do que se imagina

Por Paulo Moreira Leite, do Jornalistas pela Democracia

Quem tenta iludir-se sobre possíveis benefícios que a aprovação da reforma da Previdência pode trazer ao país só precisa compreender que o Chile revoltado de hoje é um retrato antecipado do Brasil de amanhã.

Não, a reforma não vai estimular o crescimento econômico. Não vai trazer investimentos nem vai gerar empregos. Não vai distribuir renda nem reforçar laços solidários. Não vai aperfeiçoar um sistema de aposentadoria financeiramente equibrado, que só apresentou dificuldades — sanáveis — nos períodos em que a economia se engraqueceu por longos períodos. Como hoje.

Mesmo desfalcado — provisoriamente — do maligno projeto de capitalização individual, abandonado quando se verificou que a insistência numa medida tão destrutiva poderia derrubar o conjunto da obra, o projeto Guedes-Bolsonaro constitui o mais reacionário programa de reconcentração de renda e redução de direitos de nossa história.

Inspirada pela ditadura Pinochet, a mudança foi adaptada para caber num país que, apesar das muitas  fraquezas recentes, não renunciou a viver numa democracia.

Seu caráter abertamente criminoso ficou definitivamente demonstrado pela rejeição de altas patentes militares, do sistema de justiça e da alta burocracia do estado a  qualquer possibilidade de mudança. Conscientes de que o país estava colocado diante de um programa de sacrifícios  que jamais serão compensados, os setores privilegiados do Estado brasileiro se valeram de uma posição de força, típica de quem dispõe de um alto poder de retaliação contra os governos politicamente fracos, para se autoproteger enquanto davam as costas à nação.

A natureza suicida de mudanças que ninguém aceitaria voluntariamente escancarou-se pela recusa da equipe econômica em prestar qualquer esclarecimento sobre os cálculos que alimentaram o projeto. Cobrado pelos trabalhos do  professor Pedro Paulo Zaluth Bastos e uma equipe de academicos da Unicamp que tentou conhecer o assunto de perto, o governo jamais divulgou os números empregados para justificar mudanças amplas, profundas — e socialmente nocivas.

Desde o século XVIII de  Adam Smith se sabe que os empresários se mobilizam pelos “interesses egoístas” de ampliar seus lucros — e não há muito a esperar de um país empobrecido, atingido numa de suas principais riquezas, o mercado interno, um dos mais promissores dessa parte do mundo, agora enfraquecido de maneira brutal.

Sob a ditadura militar, regime que provoca referências sempre inaceitáveis de Jair Bolsonaro, o país sobrevivia sob um sistema de mentiras oficiais que produzia números falsos da inflação para esconder crueldades cometidas contra trabalhadores e a população pobre.

No Brasil de Bolsonaro-Paulo Guedes, a maioria irá sentir a injustiça da reforma na própria pele, no orçamento magro no fim do mês, no emprego que não vem, na velhice que se tornou desamparada, prejudicando a todos, inclusive crianças de famílias mais pobres.

Mais cedo do que se imagina o desastre da Previdência será cobrado e o debate sobre o mais grave retrocesso social de nossa história será retomada.

Não é uma “Página Virada”, como escreve a Folha de hoje, em Editorial. Tampouco é uma “robusta demonstração de maturidade institucional do país”, como diz o Estado.

É um retrocesso grave, que a população brasileira saberá recuperar quando tiver unidade e força para retomar  o controle sobre os destinos do país.

Como ensinou Gregório Duviver na crônica censurada numa escola privada de Belo Horizonte: “O único jeito de não ficar triste é ficar puto”.

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